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PSIQUIATRIAGERAL.COM.BR

Introdução à Psicoterapia

 

PELO

Prof. Dr. Aníbal SilveiraV1979 )

Chefe de Clínica Psiquiátrica do Hospital de Juqueri, S. Paulo.

Docente-livre de Psiquiatria, Universidade de São Paulo

N.B. - Este resumo é resultante de uma aula, gravada, no dia 17 / 6 / 75, proferida pelo Prof. Aníbal Silveira. Não sofreu nenhum processo de correção, quer seja ortográfica, quer seja na elocução de textos, pelo autor. Portanto, construções que possam comprometer pontos de vista pessoais do autor, carecem de uma melhor averiguação.

 

FUNÇÃO DA PSICOTERAPIA EM CLÍNICA – LIMITAÇÕES – INDICAÇÕES ESPECÍFICAS

 

Iniciamos hoje, um curso de introdução à psicoterapia. Não é um curso de psicoterapia, pois este exige créditos, certo número de disciplinas e dedicação e ao mesmo tempo uma supervisão. Isto será, mais tarde, objeto de estudo e supervisão direta ou indireta (TV) do trabalho de psicoterapia. O circuito fechado, já existe na maioria das clínicas americanas e européias. Esse recurso permite nos observar a cada um como está agindo na psicoterapia. Nosso curso agora é apenas um apanhado gerais informações baseadas em 15 temas.

 

A exposição será feita em 50 minutos, porém é mais importante a discussão, que permitirá ficar mais claro o que queremos dizer, definir a nossa posição e a dos ouvintes.

 

A psicoterapia é importante e não se compreende o psiquiatra que não faça psicoterapia. Esta atividade psicoterapeutica tem dado margem a muita complicação, muita competição entre psiquiatras e psicólogos. Como o psicólogo tem já um status definido e tem permissão para fazer psicoterapia e o psiquiatra que não for classificado pelo C.R.P. não tem direito de fazer uma clínica psicológica, tem da­do muita margem a ciúmes, mais que disputa, porque acharam que o psicólogo invadiu o campo psicoanalítico. Na realidade, só o fato de ser médico não autoriza a fazer psicoterapia, se não conhece as normas, as indicações da psicoterapia, não está habilitado a fazê-la.

 

O psicólogo tem uma formação nas faculdades, bem orientada, muito específica, em geral nos estudos básicos tem a fisiologia e ou outras disciplinas, a técnica de exame, mais de 2-3 anos, a técnica de entrevista; conhece as provas de projeção que faz parte do curso e a licenciatura, portanto, está habilitado para fazer psicoterapia. Nas estas diretrizes gerais do curso de psicologia não dão compreensão dos problemas psiquiátricos, de maneira que o psicólogo não tem as condições técnicas necessárias para fazer isto. Não sabe distinguir um paciente neurótico de um psicótico, embora haja psicopatologia no curso, mas não existe um treinamento específico nesse senti­do.

 

Há então dois problemas em pauta; quem está habilitado a fazer psicoterapia - está claro que o psiquiatra está, mas a psicologia foge do campo do psicoterapeuta em geral - e o psicólogo tem sido mal compreendido porque tem tendência a invadir o campo da psicoterapia de adultos; a psicoterapia infantil é acessível ao psicólogo e este tem melhores condições do que o psiquiatra nesse campo. O desenvolvimento da criança, as fases pelas quais passa, está sempre incluídos no curriculum do psicólogo e não estão no do psiquiatra em geral. Além disso, o psicólogo pode auxiliar o psiquiatra de muitas maneiras, no sentido de dar informações precisas, exatas do paciente que vai fazer psicoterapia, as condições que ele apresenta na realidade e que não é acessível ao psiquiatra porque este geral­mente se baseia no contato superficial com o paciente, não poderá por definição dizer em que condição se encontra o paciente porque não se faz uma prova psicológica habitualmente, ao passo que o psicólogo que aplica uma técnica de projeção tem multo maior número de informações que aquele.

 

Pode-se conciliar esta dificuldade entre psiquiatra e psicólogo, se dermos uma formação ao psicólogo que vai fazer psicoterapia, comparável à do psiquiatra, nesse caso a única dificuldade que haverá será quanto às condições de fazer um diagnóstico médico que foge da alçada do psicólogo. Se o psicólogo tem bom senso, é claro, re­corre ao psiquiatra em caso de dúvida e não vai submeter à psicoterapia um paciente que exige um tratamento psiquiátrico e não psicológico. Infelizmente, isto acontece com freqüência e são mal entendidos que se agravara, pois o psicólogo não tem formação clínica e muitas vezes desconhece problemas que implicam condições mórbidas gerais, mentais e recorre à expedientes ou inócuos ou ineficientes ou até contraproducentes, isto acontece também na psicoanálise, na forma mais diferenciada, mais completa de psicoterapia. O psicoanalista que não tenha formação médica ou psiquiátrica, também comete erros graves que, às vezes são irreparáveis, outras não, porque fazem psicoterapia num psicótico e a psicose se resolve por si mesma, espontaneamente e nesse caso a psicoterapia não vai agir prejudicialmente para o paciente. O que ó necessário então, é ambos terem a formação em psicoterapia.

 

Geralmente o psiquiatra faz psicoterapia de modo auto didático e ao longo do tempo vai corrigindo suas falhas, mas hoje em dia temos uma psicoterapia orientada, com conhecimento de base teórica e as várias formas, campos, da mesma, embora demorada.

 

Dizemos que há uma grande necessidade de psicoterapia e é necessário também que o clínico a conheça e compreenda os princípios psicoterapeuticos. O clínico geral tem condições de fazer psicoterapia se tiver formação para isso, pois ele está em ligações especiais afetivas em relação ao cliente, mas se ele fizer psicoterapia, não está fazendo clínica, pois são duas coisas não incompatíveis entre si, mas que absorvem o tempo total do clínico. Seu conhecimento de psicoterapia lhe servirá não para aplicá-la, mas sim para encaminhá-lo ao psicoterapeuta e para agir com as normas da psicoterapia.

 

O psicoterapeuta, além de conhecer a técnica, se é analítica, deverá ter-se submetido à análise, só assim terá autorização para praticá-la, mas pode usar a técnica sem necessidade de interpretar analiticamente.

 

O clínico vai ter que dar apoio ao paciente, ou entrar no âmbito familiar, confortar, esclarecer, discutir problemas, especial mente de ordem psicológica de desajustamento, em que tem uma grande atuação.

 

Se o psiquiatra não tiver esse conhecimento vai deturpar a psicoterapia e vai ser muitas vezes danoso para o cliente, e não é raro, ver a dissolução de casais pela psicoterapia mal orientada.

 

Se definirmos a psicoterapia como a atuação sistemática e metódica, de natureza exclusivamente psicológica, para remover dificuldades emocionais não necessariamente inconscientes, veremos uma série de atitudes que escapam a essa definição e que são tomadas como psicoterapia. Isto porque é necessário que haja uma atuação sistemática, assim a chamada psicoterapia pastoral ou religiosa, não é psicoterapia. A conversa que se faz com o paciente, informal, não é psicoterapia. Outras formas são mais próximas da psicoterapia, como a persuasão, orientação, ventilação de problemas e já podem se chamar de psicoterapia.

 

Temos dois tipos de psicoterapia: a Psicoterapia Menor que é uma técnica especial, útil e acessível de certa maneira ao clínico, mas tem nome de menor porque visa a alguns aspectos mais superficiais; é a Psicoterapia propriamente dita, em sentido estrito, que requer uma técnica muito especial e formação também.

 

Como psicoterapia menor temos as técnicas sugestivas, por exemplo, o aconselhamento, a orientação através de ventilação de problemas, o apoio, por situações psicológicas em que o médico e psicólogo tem que atuar, mas que não são exatamente psicoterapia.

 

O fato de ser sistemática, normas programadas que têm uma diretriz pré-estabelecida, que seja variável de acordo com as circunstâncias e de acordo com o problema apresentado pelo cliente, isto cai dentro do campo da psicoterapia, nós dizemos, exclusivamente psicológica. Na realidade, se usamos medicação e psicoterapia, como mostramos num trabalho de congresso de psicoterapia em 1936, que muitas vezes é indispensável a atuação medicamentosa além da psicoterapia, nesse caso a medicação não entra em conflito com a psicoterapia. Por exemplo, um paciente que tenha indicação psicoterápica e que ao mesmo tempo tenha alterações de ordem genética, principalmente ligados com o campo da epilepsia, só a psicoterapia, sem darmos atenção ao outro aspecto, não estamos atendendo adequadamente ao paciente. Muitas vezes, só a medicação resolve o problema de ordem emocional porque estes seriam o resultado da carga genética, no caso epileptóide e a psicoterapia seria desnecessária pelo menos comotécnica aprofundada, seria apenas como ventilação dos problemas e orientação correspondente. Temos assim a medicação num aspecto e a psicoterapia em outras direções.

 

A medicação tranqüilizante colide com o tratamento de psicoterapia devido a terem a mesma finalidade usando apenas recursos psicológicos; nesse caso seria uma falha técnica medicá-lo com tranqüilizantes e fazer psicoterapia que visa justamente esses problemas de ordem emocional. Só podemos associar psicoterapia e medicação quando são duas áreas distintas de atuação.

 

Outras modalidades chamadas de psicoterapia não o são, por exemplo, a chamada psicoterapia de casais, ou a psicoterapia de família; é a ação psicoterápica mas no campo da psicoterapia menor, porque para modificar o ambiente, o ajustamento das pessoas, resolver os problemas interpessoais, é mais indicada a técnica de ventilação de problemas. Mais tarde vamos discutir isso, é quase um início da psicoterapia coletiva, porque entram várias pessoas no mesmo âmbito e é indispensável conhecer a técnica para evitar a careação, pois, se nos transformarmos uma psicoterapia de casal numa careação de pessoas, estamos arruinando esse casal. É necessário nunca permitirmos que a psicoterapia de mais do uma pessoa em conjunto entre em fase de careação.

 

A ventilação dos problemas é importante, assim como a tranqüilizarão psicológica porque quase sempre é um complemento do comportamento clínico. Sabemos que muitos pacientes têm uma grande ansiedade por se acharem ameaçados de psicose ou suponham que estão em fase psicótica porque os problemas psicológicos são tão acentuados que dão a sensação à pessoa de estar fora das normas, completamente.

 

Pode-se iniciar a psicoterapia com a ventilação de problemas, não persuasão, será uma informação mais técnica que permita à pessoa sentir-se segura e veja que isto é uma fantasia, um receio que no caso não é fundado, mas que vai influir muito no comportamento do cliente, mais tarde, se necessário se fará uma psicoterapia propriamente dita, onde deveremos tomar uma outra orientação que é a de ficarmos mais neutros, mais ao lado dos problemas que a pessoa apresenta. Há de evitar o envolvimento emocional porque senão torna insuficiente a psicoterapia que de outra maneira poderia ser muito importante e útil.

 

Na psicoterapia em sentido estrito, temos uma gama que vai desde a sugestão até a psicoterapia do comportamento, hipnose, portanto sugestiva, mas cora uma técnica especial, particular, até a psicoterapia propriamente dita que deve basear-se na técnica psicoanalítica, embora não seja psicoanalítica. Esta sim, exige um conhecimento muito maior, mais aprofundado, exige o conhecimento da psiquiatria e que oriente a psicoterapia no sentido de desmontar os problemas emocionais, sempre com o critério de utilizar os recursos psicológicos, ao lado, nunca trazer diretamente os problemas que apresentam e interpretar ao pé da letra. É indispensável que os dados na psicoterapia venham através da associação de idéias e não diretamente pela informação do cliente.

 

Uma das dificuldades maiores da psicoterapia é evitar que degenere em conversa ou diálogo, entre cliente e psicoterapeuta. Muitas vezes a psicoterapia começa bem, mas como o cliente vai levando os problemas do dia a dia, há tendência a transformar-se em conversa entre pessoas que se relacionam bem; se isto acontecer a psicoterapia estará invalidada.

 

Na realidade, não se pode manter uma atitude neutra, estranha, fria em relação ao paciente, mas também não se pode levar esta relação interpessoal ao plano de amizade porque tira qualquer validade e eficiência terapêutica. Na formação que vê como se age, pode-se apanhar bem esse aspecto, a dificuldade técnica que aparece e de que maneira se pode evitar. Isto quanto ao elemento mais simples, não aquele que envolve elemento sexual ou de sedução sexual comparável à isto. Mesmo nessa relação interpessoal, caso mais neutro, há sempre um prejuízo que é o de não tomar a posição de psicoterapeuta e ficar em igualdade de condições com o cliente. Esta dificuldade aparece com certa freqüência, pois vemos que pessoas muito capacitadas para exercer psicoterapia falham por completo porque não tiveram na ocasião oportuna, a atitude de desligar a situação da psicoterapia, duma situação de amizade. Veremos depois como se pode evitar isto, como informação apenas.

 

Outras duas técnicas, intermediárias entre estas, são a de grupo que é mais específica que a terapia de família e o grupo discute e adquire uma eficiência muito grande porque mobiliza reações emocionais intensas e postas em prática, portanto mais eficiente em alguns aspectos do que a psicoanálise em que a manipulação dos problemas é apenas emocional. No psicodrama é emocional e ao mesmo tempo ativa ou conativa, mas em função da maior profundidade da ação torna-a mais perigosa, exatamente porque existe um conhecimento mais rigoroso da pessoa que está sendo submetida ao tratamento e do grupo que se forma nesse tipo de psicodrama.

 

Em todas as situações coletivas, comum, de grupo, psicoanalítica em grupo ou psicodrama há sempre uma série de tendências que são sufocadas, digamos assim, na vida prática, diária e que tem tender cia a aparecer no psicodrama, exatamente porque as realizações que traduzem de certa maneira a reação emocional, estão sendo postas em prática como vivendo esta situação no momento.

 

Outra técnica menos ativa que a anterior é a psicoterapia de grupo, e a tendência atualmente, não só entre nós, é transformar a psicoterapia de grupo em psicoterapia analítica de grupo que para informação apenas, citamos hoje esse aspecto. Na psicoterapia analítica, cada palavra, cada situação, cada dinamismo que é verbalizado, sonho ou fantasia, é muito individual, tem uma significação específica para quem está verbalizando esse aspecto. É sabido desde o início que o analista tenha multo fato para só verbalizar as interpretações quando for oportuno, isto é, quando o cliente tiver amadurecido de tal forma as associações livres que faz que uma interpretação seja indicada e que resolva nesse momento realmente, uma série de problemas emocionais que tinham ficado ocultos no paciente. A interpretação é a parte mais difícil da psicoanálise porque envolve uma situação emocional muito específica que é só peculiar àquele indivíduo, o mesmo tipo de sonho, de fantasias que outras pessoas tenham apresentado, tem uma significação muito diversa de um cliente para outro, devido às reações emocionais, a experiência de cada um que não se repete com ninguém mais.

 

No grupo, o que a pessoa verbaliza tem uma conotação para quem verbaliza, mas não para os outros integrantes do grupo, portanto interpretar em grupo é uma falha muito grande, vai trazer uma intelectualização e não uma solução emocional. Na psicoanálise de grupo, o analista deverá saber utilizar a interpretação para si próprio e não para verbalizar no grupo, de maneira que a psicoanálise de grupo é um contra-senso, ela é essencialmente individual e exclusivamente individual. Não há análise de grupo, o que há é interpretação analítica dos dados que surgem no grupo, mais isto é outro problema. Se nós usarmos essa técnica, o analista está arriscado a fazer o que se faz habitualmente na interpretação analítica, usar um pressuposto analítico.

 

Vemos na grande maioria das revistas analíticas, publicadas, que o analista inclui o cliente no esquema pré-fabricado e que é o clássico, desde Freud, Nesse caso, em vez de fazer uma interpretação daquilo que é uma situação real vivida pelo paciente, mas não consciente, o que ele faz é uma verbalização intelectualizada a partir de um pressuposto e não a partir de dados reais. Esta é uma falha multo grande que notamos na literatura analítica.

 

Interpretar situações clínicas como sendo função de situações emocionais analíticas é falha grave, alguns analistas têm dito que não conhecem nenhum paciente que tenha sido curado (expressão habitual) com a psicoanálise; realmente, isso não acontece, conhecemos pacientes que resolvem muitos problemas, mas ficam dependentes, sempre, do analista, não estando liberados dos seus problemas, apenas transferem ao analista uma série de soluções que deveriam partir dele próprio, isto é porque há essa falha técnica que decorre principalmente da formação analítica.

 

Para evitar este tipo de dependência que não leva à solução habitual, foi que Franz Alexander criou a analise abreviada ou a psicoterapia ativa (analítica). Este autor, fundador do Instituto de Psicoanálise de Chicago, usava todos os recursos ortodoxos, conhecia todos os auxiliares que passavam pela análise, utilizava o critério analítico para mobilizar os problemas do paciente e assim muitas vezes com duas semanas, três, de psicoterapia analítica resolvia os problemas que outros analistas levavam anos, sem resolver. A técnica que usou era a ativa, mas era ortodoxo, não era dissidente da análise de Freud.

 

Ele levou em conta uma série de fatores clínicos e especialmente bom senso, de que a maioria dos pacientes não necessitam esta classe de análise ortodoxa, uma psicoterapia mais superficial é mais eficiente porque ataca problemas atuais, recentes sem ficar revolvendo os problemas da infância, remotos que não são na maioria dos casos a causa dos distúrbios que o cliente apresenta.

 

Outro aspecto que deve ser levado em conta para a psicoterapia é se o paciente deve ser encaminhado à psicoterapia comum ou à psicoterapia analítica. Isto só sabemos estudando o paciente, não podemos concluir, precisamos todos os dados. O estudo que se faz através da psiquiatria, avaliar se o problema é profundo, da fase pré-consciente do indivíduo que não tomou contato com a realidade ainda, ou se o problema surgiu na fase mais recente, a partir dos 5-7 anos; nesse caso, a psicoterapia profunda não vai resolver os problemas porque fica removendo situações emocionais muito antigas que não são a causa dos distúrbios que a pessoa apresenta, embora seja um quadro neurótico realmente.

 

Vemos assim que a formação do psicoterapeuta exige um trabalho profundo, não se pode improvisar uma psicoterapia.